NY TIMES – A nova série da Disney+, estrelando Anthony Mackie e Sebastian Stan, usa seus super heróis para examinar um mundo ainda tenso após uma catástrofe global.

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‘Falcão e o Soldado Invernal’ continua a histórias de seus personagens-título, interpretados por Anthony Mackie, e Sebastian Stan. Créditos: Dina Litovsky para The New York Times.

Quando Anthony Mackie recebeu o telefonema de que os executivos da Marvel Studios queriam se encontrar com ele logo após o lançamento do blockbuster de super-heróis de 2019, “Vingadores: Ultimato”, ele percebeu que estava conseguindo um novo trabalho ou que seria demitido.

Mas depois de muitos anos e vários filmes da Marvel nos quais ele interpretou Sam Wilson, aquele aliado do Capitão América que também é conhecido como o Falcão, Mackie estava se sentindo otimista.

“Estou assumindo que o próximo filme do ‘Capitão América’ serei eu”, disse ele.

Então Mackie viajou para os escritórios da Marvel em Burbank. “Eu coloquei um terno”, disse ele. “Fiquei sentado lá como se eles estivessem prestes a me contar as melhores notícias que eu poderia receber.” Sua voz exuberante diminuiu ligeiramente enquanto ele continuava: “Então eles falaram tipo, ‘Vamos fazer um programa de TV,’” disse ele.

Além do desânimo passageiro por não estar recebendo a oferta de outro filme, Mackie disse que temia não ser capaz de traduzir a marca Marvel para a TV.

“Fui pego de surpresa”, disse ele, “principalmente porque não queria manchar o nome da Marvel”.

Foi assim que Mackie soube de “Falcão e o Soldado Invernal”, a nova série Disney + que fará sua estreia em 19 de março e continuará as aventuras daqueles dois aliados relutantes, interpretados por ele e Sebastian Stan.

The series could address whether Mackie’s character Sam Wilson, who inherited Captain America’s shield in “Avengers: Endgame,” will eventually inherit the title as well.

A série pode determinar se o personagem de Mackie, Sam Wilson, que herdou o escudo do Capitão América em “Vingadores: Ultimato”, irá, eventualmente, herdar o título também. Créditos: Chuck Zlotnick/Marvel Studios

Chegando duas semanas após o final de “WandaVision”, “Falcão e o Soldado Invernal” é a segunda série da Marvel que procura estender os personagens e o momentum de seu universo cinematográfico para o streaming de televisão. A missão narrativa da série é direta: contar o próximo capítulo da história de seus personagens-título, vistos pela última vez em “Ultimato”, depois que um envelhecido Steve Rogers (Chris Evans) se aposentou como Capitão América e deu seu escudo para Sam Wilson.

Tanto em sua história quanto em seu subtexto, essa série pergunta: como a franquia da Marvel pode continuar sem uma de suas figuras mais proeminentes?

Como explicou Stan: “Nós vamos explorar onde esses dois caras pararam, com um grande personagem faltando — uma figura proeminente que os trouxe para a vida um do outro. Onde eles estão e como eles estão lidando com o mundo?”

“Falcão e o Soldado Invernal”, que consiste em seis episódios de 45 a 55 minutos a serem lançados semanalmente, oferece explorações oportunas da natureza do patriotismo e do extremismo e dos valores de inclusão, diversidade e representação, ambientados em um mundo que está lutando por estabilidade após uma catástrofe global.

É também uma série carregada de implicações para o personagem Sam Wilson e para o ator Mackie, que, em um universo com poucos e preciosos heróis negros, agora tem a chance de se tornarem personagens principais após longas carreiras como sidekicks.

“Eu me acostumei a ser o cara esquecido”, disse Mackie. “Tornou-se parte da minha marca.”

O palco para “Falcão e o Soldado Invernal” foi montado há dois anos, quando a Disney introduziu seu serviço de streaming Disney+ e procurou seus estúdios subsidiários em busca de conteúdo original.

Ao mesmo tempo, o Universo Cinematográfico Marvel estava chegando a um ponto inflexão narrativo com “Ultimato”, que disse adeus a personagens amados, como Steve Rogers, enquanto criava oportunidade para o surgimento de novos campeões.

Kevin Feige, o presidente da Marvel Studios, disse que desde o início, sua empresa queria que os programas da Disney+ parecessem importantes quanto aos seus filmes em termos dos seus valores de produção e dos personagens e histórias que incluíam.

“No que diz respeito à Marvel Studios, o MCU agora vive em filmes e séries”, disse Feige. “Nós queríamos muito que as pessoas se acostumassem com a ideia de que haveria um vai e vem. A história será consistente e igualmente importante nos dois lugares.”

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Falcão e o Soldado Invernal são aliados imporváveis com histórias profundas nos quadrinhos que os filmes MCU não exploraram totalmente. Créditos: Chuck Zlotnick/Marvel Studios

 

A Marvel começou a desenvolver séries como “WandaVision” e “Loki”, sobre o trapaceiro asgardiano interpretado por Tom Hiddleston. O estúdio viu também potencial no Falcão e no Soldado Invernal, dois aliados improváveis com histórias profundas nos quadrinhos que os filmes MCU não exploraram totalmente. 

Stan acompanhou as reviravoltas da Marvel por uma década. Ele se juntou à franquia de filmes como o amigo legal de Steve Rogers, Bucky Barnes, em “Capitão América: O Primeiro Vingador” (2011) e seu personagem foi atualizado para se tornar um temível assassino na sequência “Capitão América: O Soldado Invernal” (2014).

Quando a Marvel inicialmente contou a ele sobre a ideia de uma série de TV, Stan disse, “foi direto e um pouco ambicioso ao mesmo tempo.

Há uma lógica inerente em emparelhá-lo com Mackie e deixá-los brincar um com o outro, disse Stan. “Eu pensei tipo, sim, isso soa incrível — parece também que poderia ser um milhão de coisas diferentes.”

Poucos meses depois, disse Stan, o estúdio entrou em contato novamente com um plano mais detalhado para um enredo de seis horas que ofereceria “tempo suficiente para construir cenas  e entrar em suas vidas pessoais — um dia na vida de Bucky Barnes, um dia na vida de Sam Wilson — como você nunca viu antes.”

O projeto para a TV também foi cuidadosamente avaliado por Mackie, que disse ter abraçado a contragosto um tipo de status de jogador de equipe que ganhou com seus papéis em filmes como “Guerra ao Terror” e “Half Nelson”. 

“Eu sempre brinco com todo mundo, se você é um ator branco e quer ser indicado ao Oscar, você precisa me fazer estrelar ao seu lado”, disse ele.

Acima de tudo, Mackie, que já falou abertamente sobre seu desejo de ver mais representatividade nos projetos da Marvel, disse que esperava por uma narrativa que abrace a complexidade de sua cena final em “Ultimato”.

Nessa sequência, quando Rogers pergunta a seu personagem como é segurar o escudo do Capitão América, Wilson responde, “como se fosse de outra pessoa”.

Da perspectiva de Wilson, Mackie disse que o momento “não foi uma oportunidade — foi um fardo gigante.”

“Não era uma coisa dele sentar e esperar pelo escudo”, continuou. “Ele não estava procurando por uma promoção no trabalho.”

Malcom Spellman, que criou “Falcão e o Soldado Invernal” para a televisão e é seu principal escritor, disse que embora o conceito da Marvel para a série sempre tenha sido “uma série focada em duas pessoas” (a buddy two-hander, em inglês), ele queria especificamente modelar o show no gênero de filmes que tratavam de questões raciais, como “The Defiant Ones”, “48 Horas”, “Máquina Mortífera” e “A Hora do Rush”.

Spellman, um escritor e produtor em séries como “Empire”, disse que “o que sobreviveu desde o primeiro dia em que eu entrei nas diferentes iterações desse projeto foi o espírito e o conflito dos dois personagens centrais.”

Barnes, um veterano de combate que sofreu lavagem cerebral e passou períodos da sua vida em animação suspensa, é “alguém que tem 100 anos de idade e não fez nada além de lutar”, disse Spellman, enquanto Wilson passou sua carreira lutando com “toda a coisa da excelência preta — o conceito de trabalhar duas vezes mais duro para chegar na metade.”

“Se você quiser alguma honestidade com eles, você não pode evitar todo o trauma que Bucky passou, e você não pode evitar o fato de que Sam é preto”, disse Spellman.

Para os fiéis da Marvel, a série revisita personagens dos filmes do “Capitão América”, como a agente de inteligência Sharon Carter (Emily VanCamp) e o vilão Helmut Zemo (Daniel Brühl). Também apresenta um novo potencial antagonista, John Walker (interpretado por Wyatt Russell), que nos quadrinhos era um aventureiro e potencial sucessor do Capitão América. Ele acredita que é uma personificação melhor dos valores americanos do que Steve Rogers.

Como fez com outros projetos, a Marvel está sendo recatada sobre os detalhes do enredo. Mas os criadores de “Falcão e o Soldado Invernal” disseram que a série enfrentaria as mesmas questões que o país tem se perguntado nos últimos meses turbulentos: Quem é um americano e quem decide quais princípios o país defende? O que leva as pessoas a tomarem atitudes extremas em nome do que acreditam ser patriotismo?

Kari Skogland, que dirigiu todos os seis episódios, disse que a série continuou a abraçar os mesmos temas controversos — “não apenas questões atuais, mas questões difíceis de falar sobre” — que o Capitão América foi pioneiro como personagem de quadrinhos. Em sua primeira capa, em 1941, o herói foi retratado socando Hitler no rosto, e ele evoluiu ao longo das décadas para refletir a ambivalência dos americanos sobre sua liderança e as ações tomadas em nome de sua nação.

Os quadrinhos que a Marvel publicou em sua era de formação “nasceram de uma época em que o mundo estava se recuperando de uma série de eventos muito particular”, disse Skogland, que também dirigiu programas como “The Handmaid’s Tale”, “The Americans” e “The Walking Dead”.

“Eles vieram de um pós-guerra, um espaço antifascista e estavam falando sobre a moral e a ética que prevaleciam na época”, disse ela. “Eles nunca se esquivaram disso.”

Stan disse que era inevitável que os espectadores vissem na série paralelos com crises recentes como o ataque do Capitólio em 6 de janeiro — não porque seus criadores tenham antecipado ou copiado especificamente esses eventos, mas porque eles procuraram contar uma história sobre um país em uma encruzilhada perigosa consigo mesmo.

“Assistir às coisas que estavam acontecendo no Capitol foi incrivelmente perturbador”, disse ele, “e também foi particularmente perturbador para nós porque de alguma forma os eventos refletiram coisas que estão acontecendo na série. Você não pode fazer uma série como esta e não falar sobre essas coisas.”

Se a série fosse, em última análise, conceder a Sam Wilson o status e o título de Capitão América — uma questão que parece pronta para ser abordada durante sua execução, embora o resultado não seja garantido — isso teria um peso simbólico considerável, Mackie reconheceu.

Mas, por enquanto, o ator preferiu falar mais amplamente sobre o Capitão América como um personagem que representa uma responsabilidade que todos os americanos têm de preservar o tecido da nação.

“A ideia do Capitão América é, eu sou o guardião do meu irmão”, disse Mackie. “Em algum lugar ao longo da linha, nós esquecemos disso. A América é a terra da oportunidade, da liberdade, escolha e poder, e o Capitão América representa tudo isso — ele representa isso para todos”.

É claro que seria extremamente poderoso para as crianças preta poderem ver o Capitão América retratado por um ator preto, disse Mackie. Mas “é importante também para uma criança latina, branca ou asiática ver um Capitão América preta”.

Apontando para a gama cada vez mais diversificada de super-heróis que as editoras de quadrinhos e estúdios de entretenimento ampliaram nos últimos anos, Mackie disse: “Foi muito importante quando Miles Morales se tornou o Homem-Aranha. Precisamos da Mulher Maravilha e do Capitão Marvel para que as garotas possam olhar e dizer, eu posso ser isso. Isso é tão importante quanto ter um Capitão América preto.”

Seja qual for o resultado de “Falcão e o Soldado Invernal” para ele e seu personagem, Mackie, agora com 42 anos, disse que esperava permanecer no jogo dos super-heróis por mais tempo e se arrependeu de não ter entrado nele antes.

“Eu gostaria de ter feito isso nos meus 20 anos”, disse ele. “É preciso muito Advil para fazer uma série da Marvel.”